29 de abril de 2020

Chega ao fim o casamento entre Boeing e Embraer.

A Boeing anunciou que rescindiu, unilateralmente, o Contrato de Transações Mestre com a Embraer, pelo qual as empresas buscavam “estabelecer um novo patamar de parceria estratégica”, e segundo o comunicado da empresa estadunidense, a decisão veio “após a Embraer não ter atendido as condições necessárias”.

As partes planejavam criar uma joint venture composta pelo negócio de aviação comercial da Embraer e uma segunda joint venture para desenvolver novos mercados para a aeronave de transporte aéreo médio e mobilidade C-390 Millenium.

Com a crise gerada pelos dois acidentes com os aviões 737 MAX, que mataram 346 pessoas e levaram o modelo a parar de operar, além dos efeitos da pandemia de coronavírus, fizeram com que a Boeing passa-se a enfrenta sérios problemas financeiros e houve rumores de uma possível falência. Já a Embraer registrou prejuízo líquido de R$ 1,3 bilhão em 2019 e está com produção paralisada em meio à crise, e com tais fatos, ficou desvalorizada frente ao preço que a Boeing havia ajustado pagar.

O dia 24 de abril de 2020 era a data limite inicial para rescisão, passível de extensão por qualquer uma das partes caso algumas condições fossem cumpridas. A Boeing exerceu seu direito na data.

“A Boeing trabalhou diligentemente nos últimos dois anos para concluir a transação com a Embraer. Há vários meses temos mantido negociações produtivas a respeito de condições do contrato que não foram atendidas, mas em última instância, essas negociações não foram bem-sucedidas. O objetivo de todos nós era resolver as pendências até a data de rescisão inicial, o que não aconteceu”, disse Marc Allen, presidente da Boeing para a parceria com a Embraer e operações do Grupo, em nota. “É uma decepção profunda. Entretanto, chegamos a um ponto em que continuar negociando dentro do escopo do acordo não irá solucionar as questões pendentes”.

Além da venda do braço de aviação comercial da Embraer, o acordo previa a criação de uma joint venture para a comercialização do cargueiro militar C-390 Millenium, o maior avião já desenvolvido no Brasil e cujo projeto foi recém-concluído. Havia possibilidade de essa nova empresa, da qual a Embraer seria sócia majoritária, instalar uma linha de produção do modelo nos EUA, para pode ampliar seu potencial de vendas para o governo americano e outros países parceiros de Washington.

Com a rescisão do contrato, a criação da joint venture também foi cancelada. As duas companhias, porém, manterão um acordo para que a Boeing venda e faça manutenção do C-390 em parceria com a Embraer.

A parceria proposta entre a Boeing e a Embraer, anunciada em julho/2018, ao valor aproximado de de US$ 4,2 bilhões, já havia recebido aprovação incondicional de todas as autoridades regulatórias, exceto a Comissão Europeia.

A Embraer respondeu às afirmações, três horas depois, também em nota, na qual acusou a americana de ter rescindido o contrato de forma indevida. “(A Boeing) fabricou falsas alegações como pretexto para tentar evitar seus compromissos de fechar a transação e pagar à Embraer o preço de compra de U$ 4,2 bilhões.

A Boeing inclusive indicou que a indústria aeroespacial americana necessitará de US$ 60 bilhões do governo para sobreviver. A empresa seria a principal beneficiada se esse montante for liberado. Nos EUA, porém, a possibilidade de parte desse dinheiro ser usada para comprar uma empresa brasileira é alvo de críticas.

A nota afirma ainda que a empresa acredita que a Boeing vinha adotando “um padrão sistemático de atraso e violações repetidas ao MTA ( acordo), pela falta de vontade em concluir a transação, pela sua condição financeira, por conta dos problemas com o 737 MAX e por outros problemas comerciais e de reputação”.

A Embraer afirma que “buscará todas as medidas cabíveis contra a Boeing pelos danos sofridos como resultado do cancelamento indevido”.

Com a rescisão do contrato com a Boeing, a Embraer agora brigará sozinha contra gigantes. Tudo se torna mais grave porque a brasileira acaba de investir US$ 1,75 bilhão para desenvolver três novos modelos de aviões, os E2, que, apesar de serem considerados os melhores da categoria, estão sendo pouco demandados. “As vendas estão fracas porque o setor já não ia muito bem”, afirmou uma fonte.

O processo de separação da divisão comercial da Embraer também estava praticamente concluído e havia exigido milhões de dólares. Apenas na nova sede da companhia haviam sido aportados US$ 30 milhões (quase R$ 170 milhões na cotação atual).

O rompimento do acordo foi visto dentro do governo brasileiro como um desfecho já esperado, diante da grave crise enfrentada pela empresa estadunidense, e pelo baque que a pandemia do novo coronavírus provocou no setor aéreo. Na ala militar, o negócio não era unanimidade e, por esse motivo, o desmanche do acerto não foi lamentado, pelo contrário, foi até comemorado, e os defensores do Plano Pró-Brasil de investimentos públicos em infraestrutura, por sua vez, já usam o rompimento do acordo como munição para a estratégia do defesa do programa.

Fonte: https://www.infomoney.com.br/

Embraer inaugura hangar na unidade de Gavião Peixoto Operacional ...
Samolot KC-390 pomyślnie przechodzi kolejne etapy prób w locie
Governo poderá utilizar golden share para barrar Boeing-Embraer ...
Fotos meramente ilustrativas - Reprodução de internet

Liminar permite redução no aluguel pago por restaurante durante Coronavírus.

A pandemia do coronavírus fará todos experimentarem prejuízos econômicos, principalmente no meio privado. Cabe ao Poder Judiciário intervir em relações jurídicas privadas para equilibrar os prejuízos, caso fique evidente que, pela conduta de uma das partes, a outra ficará com todo o ônus financeiro resultante deste cenário de força maior.

Com esse entendimento, o Exmº. Juiz Dr. Fernando Henrique de Oliveira Biolcati, da 22ª Vara Cível de São Paulo, concedeu liminar para reduzir o valor do aluguel pago por um restaurante em virtude da epidemia da Covid-19 no Brasil, que resultou na redução das atividades e dos rendimentos do estabelecimento. Pela decisão, o restaurante pagará 30% do valor original do aluguel enquanto durar a crise sanitária.

Na decisão, o Magistrado citou o decreto estadual que regulamenta a quarentena em São Paulo, proibindo o atendimento presencial nos restaurantes, o que afeta diretamente as atividades do autor da ação. Por outro lado, Biolcati destacou que o aluguel também é uma fonte de renda para os proprietários do imóvel. 

"O contrato de locação é bilateral, na medida em que determina prestação e contraprestação a ambas as partes contratantes, quais sejam a disponibilização de bem imóvel mediante o pagamento dos alugueres, comutativo e de execução continuada", afirmou o Juiz. Segundo ele, incide no caso o artigo 317, do Código Civil.

Para revisão do valor do aluguel, é preciso demonstrar alteração da base objetiva do contrato, em razão de circunstância excepcional. É o caso dos autos, segundo Biolcati. Ele afirmou que a redução do aluguel é necessária para manter a saúde financeira do restaurante, sem prejudicar os proprietários do imóvel, que continuarão tendo uma fonte de renda durante a pandemia.

"Este é o caso dos autos, na medida em que a pandemia instaurada pela disseminação rápida e global de vírus até então não circulante entre os seres humanos acabou por levar as autoridades públicas a concretizar medidas altamente restritivas de desenvolvimento de atividades econômicas, a fim de garantir a diminuição drástica de circulação das pessoas e dos contatos sociais", completou.

Com esses fundamentos, o Eminente julgador entendeu ser "cabível a revisão episódica dos alugueres, com a finalidade de assegurar a manutenção da base objetiva, para ambas as partes, gerando o menor prejuízo possível a elas, dentro das condições de mercado existentes", e assim, presentes os requisitos do Código de Processo Civil, deferiu a tutela de urgência requerida pelo locatário, e autorizou o pagamento de 30% do valor original do aluguel, reduzindo-os, provisoriamente, de R$30.568,60 para R$9.170,58.

Fonte: https://www.conjur.com.br/

TCE suspende compra de 7 mil impressoras pelo Tribunal de Justiça ...
Foto meramente ilustrativa.

Alterações imprevisíveis das circunstâncias: impactos contratuais.

Nas últimas semanas, como era de se esperar, vários artigos e opiniões sobre os impactos jurídicos da pandemia da Covid-19 foram publicados. Provavelmente, um dos temas mais discutidos até aqui diz respeito aos contratos e a possibilidade de a pandemia ensejar um cenário de força maior.

Algumas opiniões iniciais se açodaram em concluir que, em geral, contratantes não responderiam pelo inadimplemento de suas obrigações por decorrência da severidade da iminente crise econômica. Após algumas semanas de reflexão, uma segunda onda de opiniões vem, acertadamente, sugerindo maior reflexão sobre essa importante questão.

De qualquer modo, a única certeza é que estamos passando por um período de instabilidade, cujo fim ainda é impossível antever. Tal situação conturbada, fatalmente, poderá implicar diferentes orientações em futuras decisões judiciais.

Não só isso, a despeito de fortíssima tradição jurisprudencial contrária à revisão ou à resolução do contrato por eventos macroeconômicos em geral, os precedentes judiciais, em especial, do Superior Tribunal de Justiça, podem não ser suficientes para estabelecer, por ora, um grau desejável de segurança jurídica, porque a situação atual é obviamente inédita em tempos modernos.

É nesse contexto em que a lúcida compreensão dos institutos cunhados no Código Civil revela-se ainda mais importante, pois os efeitos da pandemia, seguramente, servirão de gatilho para configurar distintas situações, como por exemplo: (i) força maior (art. 393 CC), (ii) onerosidade excessiva (art. 478-480 CC); e (iii) desproporção do valor da prestação (art. 317 CC); além de outras em hipóteses mais específicas, como as que, e. g., regulam (iv) as relações de consumo (art. 6o, V, CDC) e (v) os contratos administrativos (art. 65, II, d, da Lei 8.666/93).

Contratos interempresariais: Nos termos do art. 393 CC, salvo disposição em contrário, a força maior é a matriz do evento que afasta a responsabilidade do contratante pelo inadimplemento da obrigação. Quando a obrigação não puder ser cumprida no tempo e no modo pactuados, por motivo de força maior, não haverá indenização por prejuízos causados.

Por isso que a força maior jamais poderá ser suscitada como fundamento para rescisão ou revisão de cláusulas contratuais. Ela, simplesmente, afasta a responsabilidade pelo inadimplemento, sendo sempre aferida ex post, segundo as vicissitudes de cada caso concreto. A exceção ocorre se o obrigado já se encontrava em mora ao tempo da ocorrência do evento de força maior (art. 394 CC).

As situações podem ser das mais variadas, desde o impedimento físico para o cumprimento da obrigação (e.g. fechamento de fronteiras) até o acometimento de doença que inviabilize o cumprimento da obrigação intuitu personae .

Para que a responsabilidade civil não seja imputada ao inadimplente, o cumprimento da obrigação deve se ter tornado realmente impossível ou completamente inútil, situação em que a força maior sequer precisa ser reconhecida por sentença desconstitutiva da obrigação. Pode até mesmo ser arguida como matéria de exceção, em sede de defesa.

Caso o cumprimento seja possível, tendo se tornado apenas mais oneroso do que esperado, a situação se aproximaria da chamada onerosidade excessiva, mormente nas relações de longo prazo — contratos de execução diferida (e. g. empreitada), continuada (e.g. depósito) ou de trato sucessivo (e. g. fornecimento).

Desde a concepção da teoria da cláusula rebus sic stantibus em época medieval (notadamente nas Glosas de Acúrsio e nos Comentários de Bártolo), é familiar a ideia de que a alteração superveniente das circunstâncias pode abalar o vínculo contratual. Já no século XX, os períodos críticos do pós-guerra inspiraram variadas teorias, dentre as quais as mais conhecidas são a teoria da imprevisão de origem francesa, a da base objetiva do negócio jurídico, de matiz alemã e a da excessiva onerosidade, positivada nos arts. 1.467 e 1.468 do Código Civil italiano.

Na sistemática brasileira, foi adotada, com algumas nuances novas, a teoria italiana da onerosidade excessiva. Com fundamento no art. 478 CC, a resolução contratual pode ser pleiteada caso eventos imprevisíveis (e somente imprevisíveis, não necessariamente extraordinários) tenham tornado a prestação muito mais onerosa do que se poderia supor à época da contratação, ocasionando ainda, e concomitantemente, extrema vantagem para a parte contrária.

Acolhendo apenas o filtro da imprevisibilidade, a ocorrência se verifica por uma análise do grau de (im)probabilidade do evento ocorrido, mesmo que se considere que a sua gênese se situe dentro da álea contratual. Nunca foi fácil e tampouco será, no cenário atual, especificar ex ante o que poderá ser considerado imprevisível para a procedência de um pedido de resolução contratual, mesmo levando em conta a significativa tradição jurisprudencial contrária ao reconhecimento da imprevisibilidade por eventos puramente macroeconômicos, como “mudança de moeda; inflação; variação cambial; maxidesvalorização; crise econômica; aumento do déficit público; majoração de alíquotas” (cf. Otavio Luiz Rodrigues Junior. Revisão judicial dos contratos e seus problemas contemporâneos).

Na tradição francesa, segundo a teoria da imprevisão “pura”, a alteração das circunstâncias precisaria ser não apenas imprevisível, mas também extraordinária. Para o reconhecimento do direito à resolução, seria inafastável a comprovação de que a circunstância foi modificada por evento oriundo de uma álea extraordinária, completamente impossível de ser antevista. Mais raras, então, seriam as hipóteses do direito à resolução contratual.

Já o último requisito previsto pelo art. 478 CC —extrema vantagem para a parte contrária — é frequentemente criticado pela doutrina e afastado pela jurisprudência. Quando comprovada a onerosidade excessiva, a vantagem da contraparte seria reconhecida apenas por presunção iuris tantum (v. Ruy Rosado de Aguiar Jr. Comentários ao novo Código Civil, v. 6, t. 2. Coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 911).

Todavia, a norma não teria qualquer sentido se a resolução fosse autorizada em caso de onerosidade recíproca. Se é certo que o requisito da extrema vantagem deve ser interpretado com cautela, é igualmente evidente que que não se aplica a exceção se a contraparte estiver sofrendo os efeitos lesivos dos mesmos eventos imprevisíveis.

A resolução contratual depende, nesses termos, de reconhecimento judicial, mediante sentença desconstitutiva do vínculo contratual.

A terceira situação diz respeito à revisão contratual. O art. 317 CC prevê o direito do obrigado à correção do valor da prestação para seu valor real, em caso de manifesta desproporção oriunda de eventos imprevisíveis. Não há qualquer menção ao requisito da extrema vantagem à contraparte.

Sobre tal norma, a doutrina se divide em duas posições que, em última instância, levam a conclusões semelhantes.

Parte da doutrina interpreta o art. 317 CC como norma que hoje se tornou vazia, pois teria sido sancionada para conter desproporções em períodos de severa volatilidade cambial e problemas decorrentes de hiperinflação, com critérios preestabelecidos de atualização monetária. Durante a tramitação do Projeto de Código Civil, em mais de uma ocasião, a redação do dispositivo aludiu expressamente à “desvalorização da moeda”. Assim, quanto muito, referida norma seria um apêndice da resolução contratual por onerosidade excessiva nos termos do art. 478 CC (v., por todos, Otavio Luiz Rodrigues Junior. Op. cit.).

O outro segmento da doutrina enxerga o art. 317 CC como dispositivo de suma importância, por entender que é nele que estaria propriamente consubstanciado o direito à revisão contratual por eventos imprevisíveis, ao passo que o art. 478 CC diria respeito, apenas, à resolução do vínculo, como literalmente o faz (v., por todos, Judith Martins-Costa. Comentários ao novo Código Civil, v. 5, t. 1. Coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 228-258).

Seja como for, as conclusões são semelhantes. O ordenamento autoriza não só a resolução, mas também a revisão dos contratos por alterações imprevisíveis das circunstâncias, seja por força de um ou de outro dispositivo legal. O requisito distinto entre os artigos – extrema vantagem para a contraparte - não é considerado obstáculo instransponível. Assim, de duas uma, ou a extrema vantagem da parte contrária é um requisito fraco para a autorização da revisão contratual (art. 478 CC) ou a sua comprovação não é sequer necessária (art. 317 CC).

Ademais, a exemplo da tradição italiana e ao contrário da força maior, cláusulas contratuais cujo intuito seja contornar as regras referentes a revisão/resolução contratual por excessiva onerosidade são reputadas nulas. Mesmo após a chamada Declaração de Direitos de Liberdade Econômica (Lei 13.784/19) que instituiu, especificamente para os contratos interempresariais, o art. 421-A CC possibilitando a negociação ex ante de “parâmetros objetivos para a interpretação das cláusulas negociais e de seus pressupostos de revisão ou de resolução”, não parece possível dispor, de forma genérica, que a onerosidade excessiva superveniente não poderá ser suscitada para pedido de revisão/resolução do contrato.

Apesar das distinções acima delineadas, os mesmos fatos podem servir como substrato para a ocorrência de ambas situações. Tome-se o caso dos milhares de estabelecimentos comerciais que se encontram impossibilitados de abrir suas portas por força de normas transitórias. Tal situação, certamente, poderá ensejar excessiva onerosidade para um sem número de obrigações já contraídas e tornar impossível o cumprimento de outras por força maior. Vários desses estabelecimentos estão obrigados, por exemplo, a pagar aluguel e honrar o contrato de seus fornecedores, além de entregar mercadorias a seus clientes. Ora, certamente, as duas primeiras obrigações são possíveis de serem cumpridas, ainda que tenham se tornado excessivamente onerosas, pelo menos em tese. Já o cumprimento da última obrigação, de entrega de produtos, pode ter seu adimplemento impedido pela força maior.

De resto, é válida uma observação sobre outra teoria que se relaciona à temática ora visitada. De proveniência britânica, a dita frustração do fim do contrato diz respeito ao fato de o contrato ter se tornado inútil (frustrado).

A teoria remonta aos Coronation cases, quando uma série de litígios surgiu porque, em junho de 1902, o Rei Eduardo VIII postergou a data de sua coroação por ter contraído momentânea doença (o mais citado é Krell v. Henry). Ocorre que vários apartamentos avarandados com vista para o local da cerimônia tinham sido alugados. O aluguel se tornou, portanto, absolutamente inútil. A Court of Appeal, a partir de então, criou a chamada frustration of purpose, a qual, em suma, prescreve que, se o contrato não tem mais finalidade, o devedor deve ser liberado da responsabilidade.

Na doutrina brasileira, em que pese menções apenas superficiais na jurisprudência, a teoria parece ter sido importada como uma espécie de tertium genus. No entanto, o fundamento legal para ausência de reponsabilidade pelo inadimplemento na tradição jurídica do Reino Unido é a impossibility. Somente a impossibilidade do cumprimento da obrigação é que livraria o devedor de sua responsabilidade, de modo que uma atenuação da teoria admitindo também a inutilidade como pressuposto fático seria, no mínimo, coerente.

Não obstante, o art. 393 CC não faz qualquer ressalva expressa à “impossibilidade”, de modo que seria perfeitamente possível alegar força maior por inutilidade econômica da prestação, sem necessidade de socorro à uma teoria alienígena. Lembrando que aqui a ideia é de absoluta inutilidade da prestação, o que não se confunde com a onerosidade excessiva.

Feitas essas ponderações, é importante reafirmar que os efeitos de uma crise econômica e de saúde pública, como a que se avizinha, podem criar duas situações completamente distintas: (i) o afastamento de responsabilidade decorrente da impossibilidade do cumprimento de obrigações por evento de força maior (art. 393 CC) ou (ii) o direito a revisão/resolução contratual por hipótese de onerosidade excessiva superveniente e imprevisível, desde que se tenha produzido, em contrapartida, presumível vantagem extrema para a parte contrária ou, pelo menos, que a onerosidade não recaia sobre os demais contratantes (arts. 317 e 478 CC).

Relações de consumo: Nas relações de consumo, o enquadramento legal é distinto. Tal peculiaridade é esperada e até mesmo desejável, já que vige um sistema específico para a defesa do consumidor.

Nos termos do art. 6o, V, CDC, o consumidor pode pleitear a revisão contratual “em razão de fatos superveniente que as tornem excessivamente onerosas”. Analogamente, não há o requisito do caráter extraordinário do evento e, mais importante, não é necessário comprovar imprevisibilidade.

Judith Martins-Costa, de forma inequívoca, reconhece a adoção da teoria da base objetiva: “fora de dúvida, nas relações de consumo, prevalece a Teoria da Base Objetiva, acolhida no CDC”(op. cit., p. 256).

Com efeito, a teoria da base objetiva estabelece que há direito de revisão ou resolução do contrato se for alterada a base objetiva do negócio jurídico em comparação com o momento de sua celebração. Não há necessidade de se perquirir a natureza do evento que ocasionou a alteração das circunstâncias. Basta uma análise objetiva, segundo padrões de conduta esperados para relações contratuais análogas.

A cláusula geral da boa-fé objetiva, por conseguinte, é alçada a critério principal de interpretação, para se aferir eventual perturbação do vínculo contratual.

Nesse ponto, salta aos olhos a coerência do ordenamento em atribuir maior protagonismo a um princípio social como o da boa-fé, precisamente nas situações de proteção ao consumidor. Ao contrário dos contratos empresariais, que são paritários por natureza, as relações de consumo ocorrem em um ambiente de profunda disparidade entre contratantes.

Já sob a ótica do fornecedor, não há nenhum dispositivo que preveja livramento de responsabilidade por força maior, tampouco revisão/resolução do contrato por onerosidade excessiva. Em tese, poderiam ser suscitadas as mesmas normas do Código Civil. A força maior seria até plausível (e.g. estabelecimentos comerciais fechados compulsoriamente). Já a onerosidade excessiva, dificilmente seria comprovada, mas, na teoria, poderia justificar a modificação ou extinção do contrato.

Contratos administrativos: Na seara dos contratos administrativos, a disciplina legal contempla maior número de filtros. O art. 65, II, da Lei 8.666/93, acolhe integralmente a teoria da imprevisão na sua acepção francesa, ao estipular que apenas eventos imprevisíveis e extraordinários servem como fundamento para a readequação do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

O dispositivo legal abarca não só as ocorrências da teoria da imprevisão, mas também aquelas ocasionadas por atos da Administração Pública – fato do príncipe. Ao contrário da sistemática francesa, os efeitos da teoria de imprevisão e do fato do príncipe são análogos. Ambas situações ensejam o dever (e não a faculdade) de a Administração proceder ao reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, visando, em última instância, a proteção do interesse público (v. Eros Roberto Grau e Paula Forgioni. O Estado, a empresa e o contrato. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 117).

Além disso, a mesma norma também preconiza a força maior como substrato para o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato. Contrariamente aos contratos civis, a força maior não serve simplesmente para escudar a Administração de sua responsabilidade, ou seja, caso o cumprimento das obrigações se encontre obstado, é também necessária a tutela judicial para revisão do vínculo contratual.

Outra peculiaridade dos contratos administrativos é que há um regime específico para as hipóteses de rescisão do contrato, englobando, mais uma vez, ocorrências imprevisíveis e que tenham impedido o cumprimento de obrigações por prazo superior a 120 dias, facultada a suspensão temporária das obrigações (mas desde que não tenha sido proclamada circunstância de calamidade pública) (art. 78, XIV); e eventos de força maior, mantendo a disciplina dos casos de revisão (art. 78, XVII).

Conclusões: Como se observa, a alteração das circunstâncias e seu impacto nos contratos é tema intrincado, repleto de detalhes. Atentar-se às peculiaridades aqui discutidas é incumbência primordial, especialmente para informar o intérprete do melhor modo possível, a fim de alcançar a desejável uniformidade pretoriana, o quanto antes. Mesmo assim, somente o tempo permitirá compreender os verdadeiros impactos da pandemia e da crise econômica global.

Por fim, duas ressalvas, igualmente relevantes, devem ser registradas: Em que pese a doutrina e jurisprudência brasileiras ainda não terem se debruçado sobre um dever de renegociação ínsito a toda relação contratual, a exemplo do que já foi efetivado em outras experiências jurídicas, seria arriscado sustentar que tal dever simplesmente não existe no ordenamento jurídico brasileiro, mormente à luz dos princípios da função social e da boa-fé a teor dos arts. 421 e 422 CC (v., por exemplo, Vincenzo Roppo. Il contratto del duemila, 3a ed. Turim: G. Giappichelli, 2011; Oliver Hart e John Moore. Incomplete Contracts and Renegotiation. The Econometric Society, v. 56, n. 4, 1988; Anne-Sophie Lavefve Laborderie. La pérennité contractuelle. Paris: L.G.D.J., 2005). Por isso que, sem dúvida alguma, contratantes devem dar a devida atenção à possibilidade de renegociação do contrato, ainda que transitória.

A segunda ressalva concerne às leis transitórias. A conjuntura é tão alarmante que, na Alemanha, tal iniciativa já foi tomada, tendo sido prescritas inclusive regras sobre relações contratuais (v., a propósito, Otavio Luiz Rodrigues Junior. Alemanha aprova legislação para controlar efeitos jurídicos da Covid-19).

No Brasil, também já tramita, em caráter de urgência, o Projeto de Lei 1.179/2020, de relatoria do Sen. Antônio Anastasia, o qual também se direciona aos contratos, procurando regrar, em particular, a força maior, a onerosidade excessiva, o arrependimento do consumidor, a locação de imóveis urbanos e os contratos agrários, além de outras matérias.

Desse modo, mais do que a devida precaução e cautela ao lidar com os institutos contratuais clássicos, também é imperioso estar atento a eventuais mudanças transitórias que possam alterar as regras jurídicas vigentes.

Autor: Rogério Lauria Marçal Tucci LL.M. pela University of Chicago Law School, mestre em Direito Civil pela Faculdade de Direito da USP e sócio do Tucci Advogados Associados.

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 1 de abril de 2020, https://www.conjur.com.br/

22 de abril de 2020

Presidente do TJRJ proíbe o corte do fornecimento de energia elétrica por 90 dias.

O presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, desembargador Claudio de Mello Tavares, suspendeu, a pedido da Assembleia Legislativa, a decisão que permitiu a interrupção do fornecimento de energia elétrica por falta de pagamento. 

O desembargador destacou, em sua decisão, que resolução da ANEEL e a Lei Estadual nº 8.769  de 2020 assinalam que o corte do fornecimento de serviços essenciais deve ser evitado pelo prazo de 90 dias.

Segue a decisão:

"Suspensão da Execução   n° 0022076-18-2020.8.19.0000                              

DECISÃO ASSEMBLEIA  LEGISLATIVA  DO  ESTADO  DO  RIO DE  JANEIRO pretende a suspensão da decisão proferida  no  Agravo  de  Instrumento  n°  0021504-62.2020.8.19.0000, do Excelentíssimo Desembargador José Carlos Paes, nos seguintes termos: 

"(...) Nesse caminhar, o inadimplemento generalizado até o dia 22/06/2020, qual seja, por 80 (oitenta) dias, considerando que a decisão agravada foi proferida no dia 02/04/2020, poderá causar, sim, maiores prejuízos à coletividade do que o cumprimento do determinado na mencionada Resolução nº 878 da ANEEL, conforme pretende a recorrente. E isso, porque a asfixia financeira da empresa certamente provocará a interrupção total do serviço, o que atingiria toda a coletividade carioca, inclusive residências e serviços essenciais como hospitais e postos de saúde, imprescindíveis nestes tempos sombrios. Assim, igualmente presente o risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação decorrente da persistência dos efeitos da decisão ora guerreada, o que autoriza o acolhimento do pedido liminar da concessionária. Pelo exposto, defiro em parte a suspensão dos efeitos da decisão agravada para determinar que a agravante se abstenha de interromper o fornecimento de energia elétrica por falta de pagamento nas hipóteses previstas no acima transcrito artigo 2º da Resolução Normativa da ANEEL nº 878, de 24/03/2020. Comunique-se ao Juízo a quo. (CPC, art. 1019, I).8 À parte agravada, para contrarrazões, na forma do art. 1.019, II, do Código de Processo Civil. Após, ao Ministério Público." 

A decisão agravada, por sua vez, foi proferida pelo Juízo da 5ª Vara Empresarial da Comarca da Capital, nos autos da ação civil pública (processo nº 0069235-51.2020.8.19.0001), nos seguintes termos: 

“(...) Assim, diante do exposto na exordial e dos fundamentos ora mencionados, em especial as diretrizes propostas pela Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL -, bem como a Lei fluminense nº 8769/2020, em juízo de probabilidade, formado no exercício de cognição sumária, considero provável a existência do direito afirmado pela Requerente. Ademais, a eventual demora na prestação jurisdicional pode acarretar grave prejuízo à vida e à saúde dos cidadãos consumidores da Requerida. É patente, ainda, a reversibilidade dos efeitos práticos produzidos pela presente, na medida em que, na eventual revogação desta, é possível o retorno à situação de fato anterior à sua concessão. Desta feita, ante a presença dos requisitos legais, DEFIRO A TUTELA DE URGÊNCIA e determino que a Requerida se abstenha de suspender o fornecimento de energia elétrica por inadimplemento do consumidor até o dia 22 de junho de 2020, sob pena de multa de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), que poderá ser majorada em caso de recalcitrância.” 

Em suas razões, afirma que a pandemia denominada COVID-19, por ter obrigado os governantes responsáveis a determinarem draconianas medidas de isolamento social, fato notório, implicou significativo decréscimo de renda justamente das camadas sociais mais vulneráveis: os residentes em comunidades, os desempregados, os autônomos que não exercem profissões liberais, os enfermos, os pequenos empresários etc.  

Afirma que a Lei Estadual 8.769/2020 não impede a cobrança do consumidor pelo serviço de fornecimento de energia elétrica recebido, mas apenas obsta a suspensão do fornecimento de energia elétrica neste cenário excepcional de pandemia. 

Com relação à arguição de inconstitucionalidade formal da Lei Estadual nº 8.769/2020, por determinar a indistinta proibição de interrupção do fornecimento de energia por falta de pagamento, a configurar, segundo a decisão impugnada, interferência do Poder Legislativo Estadual em matéria exaustivamente disciplinada pela Resolução Normativa nº 878, de 24/03/2020, editada pela Agência Nacional de Energia Elétrica, assevera que  a ADI n° 5.961-PR foi julgada em 19 de dezembro de 2018, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), declarando-se a constitucionalidade de dispositivos da Lei paranaense n° 14.040/2003, os quais versavam sobre a proibição de concessionárias suspenderem o fornecimento de serviços públicos por inadimplemento de Consumidor durante determinados períodos. 

Requer  a suspensão  da decisão proferida  no  Agravo  de  Instrumento n° 0021504-62.2020.8.19.0000, a fim de que volte a ter plena eficácia  a  decisão proferida  pelo Juízo da 5ª Vara Empresarial da Comarca da Capital,  nos autos da ação civil pública (processo nº 0069235-51.2020.8.19.0001), até o trânsito em julgado da decisão de mérito na ação principal, nos termos do art. 4º, parágrafo 9º, da Lei 8.437/92. 

É O RELATÓRIO. DECIDO. 

A possibilidade de intervenção que a Lei nº 8.437/92 outorga à Presidência dos Tribunais, por meio da suspensão de liminares deferidas contra atos do Poder Público, tem caráter excepcional, somente se justificando nas hipóteses nela explicitadas, ou seja, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas e nos casos de manifesto interesse público ou ilegitimidade, consoante a dicção do seu artigo 4º. 

É fato público e notório que o mundo enfrenta uma pandemia de proporções inéditas, que tem levado a milhares de infectados e de mortos, ao fechamento de fronteiras, à decretação de medidas de quarentena, de isolamento social, ao colapso dos mais estruturados sistemas de saúde das nações mais desenvolvidas e preparadas para enfrentar um quadro dessa ordem. A situação é gravíssima e não há qualquer dúvida de que a infecção por COVID-19 representa uma ameaça à saúde e à vida da população. 

A pandemia acabou por levar as autoridades públicas a concretizar medidas altamente restritivas de desenvolvimento de atividades econômicas, com o escopo de garantir a diminuição drástica de circulação das pessoas e dos contatos sociais, e ocasionando, por conseguinte, redução ou corte total na renda de muitos trabalhadores no Brasil e no mundo, em razão de demissões e diminuições na jornada de funcionários em empresas, ou pela impossibilidade de que autônomos e informais exerçam seu trabalho em meio à pandemia. Muitos comércios também fecharam as portas e donos de pequenos negócios enfrentam queda no faturamento. 

Diferentemente de outras nações examinadas, o Brasil é um país em desenvolvimento, com grandes aglomerações urbanas, muitas comunidades pobres e enorme quantitativo de pessoas vivendo em situação de precariedade sanitária, o que pode agravar os riscos de contágio e de colapso dos sistemas de saúde. 

No que diz respeito ao princípio da continuidade dos serviços públicos reputados como essenciais, como ocorre com o fornecimento de energia elétrica, restou pacificado, na doutrina e na jurisprudência, o entendimento de que as delegatárias de serviço público não podem ser compelidas a prestar serviços ininterruptos, se o consumidor deixa de cumprir suas obrigações referentes ao pagamento. Assim como o particular, nos contratos de direito privado, pode recusar cumprimento da obrigação de fazer na hipótese de inadimplência pelo outro contratante, também não há como negar às concessionárias a mesma faculdade, nos contratos de direito público. Evita-se, por conseguinte, o enriquecimento sem causa do usuário e a afronta ao princípio da igualdade de tratamento entre os destinatários do serviço público. 

Em situações de normalidade social, permite-se o corte do fornecimento de energia elétrica em razão de injustificada falta de pagamento, mediante aviso prévio, porquanto a Magna Carta assegura a livre iniciativa econômica e o direito de cobrar pelos serviços, cuja exploração resulta de outorga de regular concessão. 

Na hipótese concreta, todavia, discute-se a respeito da continuidade do serviço de fornecimento de serviço público essencial diante da situação de anormalidade ora vivenciada.  

Estamos diante de um momento excepcional e incerto, sem precedentes na história da nossa geração, como bem destacou a decisão do Juízo da 5ª Vara Empresarial. A pandemia do Coronavírus atraiu reflexos imprevistos e imprevisíveis em todos os seguimentos de todas as sociedades de todos os países afetados. Impôs-se a todos nós a necessidade de adequação de rotinas e de estabelecimento de novos hábitos, tomando como premissa o isolamento social, a exigir que permaneçamos em nossas residências como forma de evitar a propagação do vírus.  

A excepcionalidade da situação gerou a retração da produção e, consequentemente, o comprometimento da renda do trabalhador, pois grande parte das empresas não tem mais faturamento e outras, diante das suas especificidades, como as de lazer e turismo, encontram-se paralisadas.  

O Superior Tribunal de Justiça, inclusive, possui entendimento firme no sentido de que a intervenção do Poder Judiciário nos contratos, à luz da teoria da imprevisão ou da teoria da onerosidade excessiva, exige a demonstração de mudanças supervenientes nas circunstâncias iniciais vigentes à época da realização do negócio, oriundas de evento imprevisível (teoria da imprevisão) ou de evento imprevisível e extraordinário (teoria da onerosidade excessiva). 

Dispõe o artigo 393 do Código Civil que, em caso de inadimplência, “o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado”. A pandemia de covid-19 se enquadraria nesse tipo de evento inevitável, a impedir o cumprimento das obrigações contratuais do aluguel na forma originalmente convencionada. 

Nesse diapasão, a Lei  Estadual  n°  8.769/2020    reconhece  a pandemia denominada COVID-19 e suspende,  enquanto  durar  a  pandemia,  o  corte  de  energia elétrica por inadimplência de qualquer consumidor, ressalvando, nos termos do parág. 3º do seu art. 2º, que o débito consolidado durante as medidas restritivas deve ser cobrado pelas vias próprias, sendo vedada a cobrança de juros e multa. 

A despeito da intenção do legislador, a Resolução ANEEL n° 878/2020 é de difícil implementação, especialmente em relação aos mais humildes, diante da dificuldade de identificar e comprovar, máxime, na atual conjuntura, quem atende aos requisitos elencados em seu art. 2º, cujos incisos reproduzo abaixo: 

“Art. 2º Fica vedada a suspensão de fornecimento por inadimplemento de unidades consumidoras:  
I - relacionadas ao fornecimento de energia aos serviços e atividades considerados essenciais, de que tratam o Decreto nº 10.282, de 2020, o Decreto nº 10.288, de 2020 e o art. 11 da Resolução Normativa nº 414, de 2010; 
 II - onde existam pessoas usuárias de equipamentos de autonomia limitada, vitais à preservação da vida humana e dependentes de energia elétrica;  
III - residenciais assim qualificadas: a) do subgrupo B1, inclusive as subclasses residenciais baixa renda; e b) da subclasse residencial rural, do subgrupo B2;  
IV - das unidades consumidoras em que a distribuidora suspender o envio de fatura impressa sem a anuência do consumidor;  
V - nos locais em que não houver postos de arrecadação em funcionamento, o que inclui instituições financeiras, lotéricas, unidades comerciais conveniadas, entre outras, ou em que for restringida a circulação das pessoas por ato do poder público competente.” 
(grifos nossos) 

Vale acentuar a constitucionalidade formal da Lei Estadual nº 8.769/2020, tendo em vista a competência do Poder Legislativo Estadual para legislar sobre a matéria, citando como precedente a ADI n° 5.961-PR, julgada em 19 de dezembro de 2018 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), onde foi declarada a constitucionalidade de dispositivos da Lei paranaense n° 14.040/2003, os quais versavam sobre a proibição de concessionárias suspenderem o fornecimento de serviços públicos por inadimplemento de Consumidor durante determinados períodos.  

Observe-se que, após o seu julgamento, em 19 de  dezembro de 2018, a Suprema Corte não enfrentou a  constitucionalidade de leis estaduais que, em períodos específicos, proibissem a suspensão do fornecimento de  energia elétrica. Confira-se a ementa do julgado mencionado: 

 "COMPETÊNCIA NORMATIVA – CONSUMIDOR – PROTEÇÃO – LEI ESTADUAL – RAZOABILIDADE. Atendidos os parâmetros alusivos à razoabilidade, surge constitucional norma estadual a versar proibição de as empresas concessionárias de serviços públicos suspenderem, ausente pagamento, fornecimento residencial de água e energia elétrica em dias nela especificados, ante a competência concorrente dos Estados para legislar sobre proteção aos consumidores – artigo 24, inciso V, da Constituição Federal." STF. Plenário. ADI 5961/PR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, red. p/ o ac. Min. Marco Aurélio, julgado em 19/12/2018 (Info 928). (grifos nossos) 

Ante os motivos expendidos, embora a interrupção do serviço de energia constitua, em princípio, exercício regular de direito, o corte do fornecimento de serviços essenciais deve ser evitado durante o prazo de 90 dias, assinalado tanto na Resolução da ANEEL quanto na Lei Estadual nº 8.769 de 2020, em homenagem aos princípios constitucionais da intangibilidade da dignidade da pessoa humana e da garantia à saúde e à vida. 

Não se pretende, aqui, estimular a inadimplência dos usuários, até porque sabemos a necessidade de a concessionária arrecadar recursos para prestar à comunidade um serviço adequado, seguro e eficiente. Contudo, cuida-se de uma situação excepcionalíssima que, dada a sua própria natureza, precisa ser tratada de forma distinta.  

Ressalte-se que não está a Presidência antecipando entendimento a ser adotado no julgamento do recurso que porventura venha a ser interposto, nem emitindo juízo de valor a respeito da solução encontrada para o conflito. Os contornos da medida já foram delineados nas linhas acima. O que se pretende nesta via é tão somente evitar riscos de lesão à economia e à ordem pública, o que restou demonstrado. 

Ante o exposto, DEFIRO o pedido de suspensão com fundamento no artigo 4º da Lei nº 8.437/92, para determinar a suspensão dos efeitos da decisão no  Agravo  de  Instrumento n° 0021504-62.2020.8.19.0000, a fim de que volte a ter plena eficácia  a  decisão proferida  pelo Juízo da 5ª Vara Empresarial da Comarca da Capital,  nos autos da ação civil pública (processo nº 0069235-51.2020.8.19.0001), até o trânsito em julgado da decisão de mérito na ação principal, nos termos do art. 4º, parágrafo 9º, da Lei 8.437/92.  

Intimem-se os interessados, servindo esta decisão como mandado judicial, e dê-se ciência à Procuradoria Geral de Justiça.

Rio de Janeiro, 09 de abril de 2020. 

Desembargador CLAUDIO DE MELLO TAVARES 
Presidente do Tribunal de Justiça"

Fonte: www.tjrj.jus.br

Novo presidente do TJRJ elege a informatização como prioridade ...
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Justiça autoriza reabertura das lojas Casa & Vídeo.

As lojas da rede Casa e Vídeo situadas no Município do Rio de Janeiro poderão reabrir suas portas para comercializar produtos considerados essenciais, como alimentos e artigos médicos e ortopédicos.

A decisão, em caráter liminar, é do Juiz substituto de Desembargador Ricardo Alberto Pereira, que modificou decisão da 14ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça do Rio, que havia negado a abertura das lojas.

No entender deste magistrado, em momentos críticos como o que toda a sociedade vivencia, há que se buscar um equilíbrio que possa, por um lado, preservar ao máximo a saúde pública através das determinações das autoridades e, por outro lado, preservar a economia como um todo, buscando socorrer todos os que podem, de alguma forma, gerar renda, manter empregos e salários, buscando assim prestar um serviço que venha atender a sociedade, na forma das determinações das autoridades.”,  destacou o magistrado em sua decisão.

Todas as lojas da rede deverão obedecer às restrições de funcionamento impostas pelas autoridades públicas, como a realização de vendas apenas por entrega, a manutenção do distanciamento de funcionários e clientes, a utilização de produtos para higiene dos locais e dos funcionários e clientes, ou quaisquer outras que venham a ser impostas.

A decisão determina ainda que, caso haja descumprimento de qualquer uma dessas regras, ocorrerá a cessação da eficácia da liminar, com o imediato fechamento completo de todas as lojas da rede Casa e Vídeo que estiverem abertas, e aplicação de multa diária fixada em 1% do faturamento bruto mensal de cada loja que descumprir a ordem judicial.

Fonte: http://www.tjrj.jus.br/

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21 de abril de 2020

Prefeitura do Rio entra na Justiça contra empresa que se recusa a entregar 80 respiradores.

No dia 20/04, a Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, por meio da Procuradoria Geral do Município, distribuiu uma ação na Justiça, objetivando receber 80 respiradores comprados da empresa Magnamed Tecnologia Médica. 

Sediada no interior de São Paulo, a empresa vendeu os equipamentos pelo valor total de US$ 744.149,61, ainda em dezembro de 2019, e agora se recusa a entregá-los, segundo a prefeitura. Encaminhada pela Exmª Juíza Dra. Ana Beatriz Mendes Estrella, a ação, agora, aguarda parecer do Ministério Público do Rio.

O argumento da empresa é de que os ventiladores foram requisitados pelo governo federal foi derrubado pelo Ministério da Saúde em ofício remetido à Magnamed no dia 25 de março. Um dia antes de a empresa afirmar que estava impedida de entregar os equipamentos, o órgão já havia determinado que os bens em estoque da Magnamed, destinados aos Estados e Municípios, fossem liberados.

A negativa da empresa em cumprir sua proposta de fornecimento de 80 respiradores (modelo portátil adulto e pediátrico) levou a Prefeitura a entrar na na Justiça para obter liminar favorável à entrega dos equipamentos.

A Procuradoria Geral do Município argumentou que a negativa da empresa põe em risco a política do Município do Rio de Janeiro para o combate à pandemia. Atualmente, o Município tem cerca de 90% dos seus leitos de UTI ocupados. Os 80 respiradores adquiridos em dezembro do ano passado possibilitarão a abertura de novos leitos para o enfrentamento do Covid-19.

Fonte: https://odia.ig.com.br/

Prefeitura de Cotia/SP deve devolver respiradores confiscados que ...
Magnamed apresenta solução completa para terapia intensiva - Saúde ...
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A realidade do mundo capitalista em meio ao Coronavírus!

Coronavírus: 'Ilha dos milionários' em Miami que está testando todos os seus habitantes!

Dizem que uma imagem pode valer mais que mil palavras e, atualmente em Miami, parece haver dois retratos que refletem perfeitamente, a diferença existente no sistema de saúde da maioria dos países capitalistas, mas no caso, em especial no sistema dos Estados Unidos.

De um lado, há filas de veículos no estacionamento de um estádio em busca de um teste para o coronavírus, e de outro, uma ilha exclusiva onde mora a elite com uma clínica privada aberta somente para fazer testes rápidos para a Covid-19 em todos os seus residentes e funcionários, que são mais de 1.000 pessoas.


Há muitos detalhes que não são visíveis nessas imagens, como o fato de que os testes são diferentes nos dois lugares e cumprem diferentes funções. Mas ambas evidenciam a profunda desigualdade de acesso à saúde no país mais rico do mundo, mas que se repete, talvez em menor escala, na esmagadora maioria dos países capitalistas.

No meio de uma pandemia como a do coronavírus, ou mesmo nas epidemias de Sarampo, Zika, Dengue ou Tuberculose, como as que ocorrem no Brasil, tal diferença contribuir para determinar, de modo decisivo, a diferença entre quem vai viver e quem morrerá. 

A controvérsia cresceu depois que o jornal The Miami Herald publicou que Fisher Island, um dos bairros mais ricos dos Estados Unidos, havia decidido comprar milhares de testes rápidos de covid-19 para o Sistema de Saúde da Universidade de Miami (UHealth), uma entidade privada.

"Para minimizar ainda mais a disseminação na densamente povoada ilha, onde metade dos moradores tem mais de 60 anos e alto risco, a Fisher Island solicitou à UHealth que lhes fornecesse testes de anticorpos covid-19 para todos os seus funcionários e residentes", afirmou à BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC, a porta-voz da ilha, Sissy DeMaria.

Fisher Island, colada à icônica Miami Beach, abriu um centro e os testes já estão sendo realizados, junto com outras medidas de prevenção.

A UHealth reconhece que seu serviço "pode ​​ter dado a impressão de que algumas comunidades receberiam tratamento preferencial", mas afirma, no entanto, que essa não era sua intenção.

"Um dos primeiros casos confirmados de coronavírus no condado de Miami-Dade foi em Fisher Island, mais da metade da população é maior de 60 anos e muitos moradores estavam voltando do nordeste", a zona mais atingida pela covid-19, destaca a porta-voz Lisa Worley em um breve comunicado.

O centro universitário tem colaborado com agências governamentais e de saúde pública e realizou uma iniciativa para testar anticorpos contra a covid-19 em 3.500 pessoas aleatórias na Flórida, informou a imprensa local.

Apesar disso, as notícias sobre Fisher Island rapidamente geraram uma onda de frustração e raiva, em razão da escassez de equipamentos e o acesso limitado a testes para o restante da população.

"Os americanos e, em parte, o resto do mundo, estão escandalizados ao descobrir que muita gente abastada pode usar seus recursos para conseguir vantagens quando tem uma necessidade médica, incluindo em uma epidemia, mas isso tem sido assim desde sempre. É algo que os americanos parecem tolerar", aponta Arthur Caplan, diretor de Ética Médica da Universidade de Nova York.

"Os Estados Unidos nunca reconheceram o direito à saúde. Muitos americanos obtiveram sua cobertura de saúde por meio do trabalho, o que significa que, eticamente, têm de conquistá-la. E se deixam de trabalhar, a perdem."

O sistema de saúde americano funciona em sua maioria à base de seguros privados, mas milhões de pessoas não os possuem, ou têm coberturas insuficientes.

"Quando não há um sistema que atenda a todas as pessoas, então existe um menor sentido ético de responsabilidade comunitária", pondera o especialista.

Nesta crise, o governo está adquirindo um papel maior que o habitual em nível federal, mas em muitos aspectos, são os Estados que têm o controle, também em questões de saúde.

Na Flórida, as autoridades instalaram oito clínicas móveis nas comunidades mais afetadas, de acordo com o Departamento de Saúde.

Um dos serviços com maior demanda está localizado em um dos estacionamentos do estádio Hard Hock em Miami, onde se celebrou este ano a final do SuperBowl.

Ali, as equipes médicas realizam diariamente os chamados testes PCR, que constatam se uma pessoa tem covid-19 por meio de uma amostra recolhida do nariz ou garganta analisada em laboratório.

Esse atendimento é diferente do que é realizado na Fisher Island, onde um exame de sangue rápido pode somente determinar se uma pessoa já teve a doença, mas não se está infectada.

Dada a quantidade de pessoas que correram para o estacionamento no Hard Rock, o pessoal da saúde teve que colocar o sinal de "fechado" pouco depois de abrir as portas por vários dias na semana passada. Essa procura levou a um aumento da capacidade, de 400 testes diários a 750, e se relaxaram os requisitos.

O caso de Fisher Island, no entanto, não é o único a evidenciar as desigualdades nessa crise de saúde, em que os Estados Unidos são a nação mais afetada em número de mortos e infectados, segundo os dados oficiais.

A imprensa americana noticiou, por exemplo, o caso de uma multinacional biomédica no Colorado que decidiu comprar testes rápidos para anticorpos covid-19 para todo um Condado, onde moram cerca de 8.000 pessoas, incluindo dois de seus executivos durante uma parte do ano.

Também ganhou fama o caso de uma comunidade de alta renda em Westport, Connecticut, que tentou o acesso a testes privados, e cita os serviços dos chamados médicos concierge, que estão oferecendo testes em domicílio.

David Nazarian é um desses profissionais. Ele tem uma clínica no luxuoso bairro de Beverly Hills, em Los Angeles, o médico observou um aumento persistente no número de consultas desde o princípio da epidemia e montou um centro de testes para atender no sistema "drive through".

"Eu trabalhei muito desde o começo porque considero muito importante (...) É uma crise que todos estamos enfrentando. Pobres e ricos. Não é sobre isso. É sobre o que todos podemos fazer para controlar esse vírus. Se não o fizermos, não pararemos as infecções e não conseguiremos levar as pessoas a retomarem suas vidas. Essa é a pergunta mais importante, porque todos sofrerão ", acredita ele.

Sua clientela se compõe basicamente por famílias ou indivíduos do mundo do entretenimento ou altos executivos, mas o profissional assegura que seus serviços estão disponíveis a todos, por um preço que ele prefere não revelar.

No entanto, Nazarian trata uma porcentagem de seus pacientes gratuitamente há 10 anos, uma tarefa que ele continua realizando neste momento crucial, afirma ele em conversa com a BBC News Mundo.

A equipe do médico realizou testes PCR ou de anticorpos em casa ou em sua clínica móvel, assim como para as empresas, com os materiais que puderam comprar e um pouco de criatividade diante da escassez de recursos, criando alguns materiais.

"Não há nenhuma dúvida que existem desigualdades e, infelizmente, sempre foi assim. Gostaria que não fosse. Todos deveriam ter acesso a uma boa saúde. Todo o mundo deveria poder fazer o teste", diz.

Em sua opinião, o governo deveria estar fazendo mais. "É lamentável que vivamos nos Estados Unidos e estejamos ficando para trás na capacidade de testes em relação a outros países.

Vemos de modo claro, no parágrafo acima, a opinião de quem se sente preterido quando os mais ricos têm acesso mais fácil e ágil para exames e tratamentos, em detrimento dos demais cidadãos estadunidenses, contudo, não se importa, minimamente, se outras países como Brasil, África do Sul, ou Índia, por exemplo, estão tendo acesso a tais insumos e equipamentos, ou seja, o que se reproduz no mercado interno daquela rica nação, é o mesmo que eles estão fazendo perante os outros, mundo afora.

Após os problemas com os testes no início da pandemia, os EUA agora estão realizando cerca de 150.000 testes diários. Mas, na opinião dos maiores especialistas da área, o número deveria ser muito maior: entre 5 milhões e 22 milhões por dia.

"Este país é um Estado falido", lamentava um enfermeiro anestesista de um hospital de Nova York no começo do mês, revelando um dos momentos mais trágicos de sua carreira.

Será que essa pandemia brutal causará uma mudança nos EUA, e no mundo?

"Não apostaria nisso", diz Caplan. Nos Estados Unidos, pondera o especialista, as ideias antigas pesam: a saúde é um privilégio, não um direito.

Já no mundo, a sabedoria popular nos ensina: "Quem pode mais chora menos!"

Fonte: https://g1.globo.com/

A ilha exclusiva de Fisher Island, um dos bairros mais ricos dos Estados Unidos. — Foto: Getty Images via BBC