29 de março de 2015

Trecho da orla do Rio até então restrito à Marinha será aberto aos pedestres.

Os cariocas estão prestes a redescobrir uma paisagem à beira-mar que, por 252 anos, ficou restrita à Marinha, na área do I Distrito Naval. Das imediações da Candelária à Praça Mauá, às margens da Baía de Guanabara, contornando o Morro de São Bento, o trecho de orla vai ganhar calçadão e jardins, integrando a nova frente marítima do Centro — um caminho contínuo de 3,5 quilômetros, do Museu Histórico Nacional ao futuro boulevard da Zona Portuária. O passeio como um todo será concluído em 2016, antes das Olimpíadas. Até o fim deste ano, porém, os cerca de 600 metros hoje só acessíveis aos militares e seus convidados já deverão ser abertos ao público, encurtando caminhos diante de uma paisagem escondida por décadas.

As obras já estão em andamento, seguindo o traçado da extinta Perimetral (construída entre os anos 1950 e 1970 e que, até ser demolida, entre 2013 e 2014, passava por cima e encobria essa faixa junto ao mar). Mas já se revelam ali diferentes olhares sobre o Rio, embora em meio ao bate-estaca e à poeira. Do novo passeio, a arquitetura do Museu do Amanhã, em construção no Píer Mauá, se apresenta exuberante. Ao mesmo tempo em que a imponência do Mosteiro de São Bento, uma das mais antigas construções do Rio, do século XVII, volta a se destacar no cenário, num ângulo que, por quase meio século, só era visto de relance por quem passava pelo elevado, e, mesmo assim, por trás do gradil que cercava a via no trecho do I Distrito Naval — uma exigência da Marinha à época para proteger suas instalações militares.

— Após a construção da Perimetral, por muito tempo o Centro do Rio virou de costas para o mar. Na nova frente marítima, a cidade voltará a olhar para a Baía de Guanabara. Isso num passeio com mobiliário urbano de design arrojado e próximo ao VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), que passará pela remodelada Praça Mauá — diz o secretário municipal de Projetos Estratégicos e Concessões de Serviços Públicos e Parcerias Público-Privadas, Jorge Arraes.

Na faixa cedida pela Marinha à prefeitura, grades vão separar a área aberta ao público (na borda da Baía) da que continuará sob o comando do I Distrito Naval. O trecho de mar ali perto continuará exclusivo para barcos da Marinha. Mas, no meio do passeio, um deque avançará sobre o mar e passará por baixo da Ponte Arnaldo Luz, que dá acesso à Ilha das Cobras, também militar. E, em todo o caminho, ganharão destaque as próprias edificações históricas da Marinha, como a sede do Comando do I Distrito Naval, o antigo Ministério da Marinha e, do outro lado da orla, os prédios das ilhas das Cobras e das Enxadas.

— Com as obras, além de integrar um circuito do Rio Antigo, acredito que aumentarão as visitações também nos centros da Marinha ali perto, como o Espaço Cultural e o Museu Naval. Essa região do Rio Antigo se transformará facilmente no nosso Pelourinho — prevê o Almirante Armando de Senna Bittencourt, Diretor do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha.

No trecho que será aberto ao público, lembra o militar, estão gravadas lembranças de alguns dos importantes marcos da Marinha, que passou a ocupar a encosta do São Bento em 1763, numa época em que o Rio se tornara o porto mais importante do Brasil Colônia. Naquele período, conta ele, o Conde da Cunha, enviado pelo Marquês de Pombal, assumiu o governo da Capitania Geral do Rio de Janeiro, com ordens de criar um estaleiro, que viria a ser o Arsenal de Marinha do Rio. O local escolhido era estratégico, no sopé do morro, em área antes pertencente aos monges beneditinos, entre a Praça Quinze e a Prainha (hoje Praça Mauá).

O primeiro navio construído no estaleiro foi a Nau São Sebastião, lançada ao mar em 1767, apesar de, na época, o estaleiro mais importante do país estar na Bahia. O daqui só ganhou evidência após a chegada da Família Real ao Rio, em março de 1808, quando passou a realizar a manutenção da esquadra de Dom João VI (que, aliás, desembarcou na região ao chegar ao Brasil).

É a partir da Independência, em 1822, que as atividades no arsenal se intensificam. Nessa época, a Marinha comprou o prédio onde hoje fica o Comando do I Distrito Naval e o transformou, primeiro, em oficinas, próximo à Praça Mauá. Era um conjunto de trapiches construídos pelos beneditinos no século XVIII e que, depois, foi vendido aos contratadores que tinham o monopólio do comércio de sal no Rio (pelo que o lugar ficou conhecido como Armazém do Sal).

Foi ainda no século XIX que a Marinha começou a construir seu primeiro dique na Ilha das Cobras, em frente ao Arsenal, para onde, na primeira metade do século XX, o estaleiro seria transferido. No lado do continente, outro importante prédio seria inaugurado em 1935, por Getúlio Vargas. O Edifício Almirante Tamandaré, em estilo art déco, foi construído para abrigar a nova sede do Ministério da Marinha e, até 1970, a Escola Naval de Guerra, hoje lugar de diferentes organizações militares do I Distrito Naval e tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (Inepac).

O edifício, na Praça Barão de Ladário, fica ao lado de outros dois prédios geminados, de 1828, construídos pelo arquiteto e entalhador Inácio Ferreira Pinto, um dos mais importantes do Rio do final do período colonial. Antes, eles faziam parte do Arsenal, e atualmente abrigam os setores de Seleção e de Identificação da Marinha. Já o Comando do I Distrito Naval foi estabelecido na região em 1943. E, dentro de seu complexo, abrigou uma série de serviços militares, como o de saúde, de odontoclínica e de assistência social, em prédios ecléticos, de meados do século XX, que também poderão ser vistos no novo passeio da orla.


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